Publicado pela primeira vez há 20 anos, em 1994,
pela Editorial Presença, com este livro inicia-se uma tetralogia da autoria de
Luísa Beltrão. Tem como pano de fundo a história de uma família, desde que um
dos seus elementos luta para enriquecer até ao inicío da geração dos seus
filhos.
Mostra-nos como se uma fortuna construída com
trabalho se pode destruir rapidamente. De como os homens são breves, e são os
seus próprios piores inimigos. Ensina-mos também que o verdadeiro valor da vida
e aquele que nos faz felizes está presente nas pequenas coisas, ou por outra,
está longe daquilo que o dinheiro pode comprar.
O livro não tem propriamente um protagonista. Ou
por outra, o protagonista vai variando ao longo da narrativa, isto é, aquele
que protagoniza determinado capítulo, passa a personagem secundária no capítulo
seguinte, ou desaparece na trama, passando o protagonismo a quem era secundário
ou surge de novo.
São seis capítulos, que iniciam cada um com uma
carta da “Tia Graça”, que virá, possivelmente, a protagonizar qualquer outro
momento num dos livros seguintes da tetralogia. Neste, ela fala dos
protagonistas em questão, do que ouviu ou conheceu dele. Depois há todo o
desenrolar da teia narrativa, em que a autora constrói uma escrita fluente e
interessante, por vezes pontuada com excelentes notas de ironia, como as
seguintes:
“O tio Luiz
era um homem muito bem parecido, loiro e com um ar muito fino. Adorava a
mulher, aliaz todos os Teixeiras sempre adoraram as mulheres, embora fossem
dados às aventuras fora de casa. Mas o tio Luiz talvez fosse o menos estroina,
por isso deixou fortuna, sempre foi bom administrador. Casou com a tia Zulmira,
que era uma senhora linda, poetiza, sempre muito janota e que gostava de ser
admirada pelos homens. Deizem que até era um pouco leviana, mas eu não gosto de
dizer mal de ninguém.” (p. 149) – de uma carta da Tia Graça
“Ana tivera
que pedir à vizinha da frente, (…), a viver sozinha no seu solar, que
albergasse o secretário Anníbal durante um mês, (…). A senhora Dona Anástácia,
solteira cinquentona, de peito farto e bigode escuro, levantara dificuldades,
«parece mal coabitar com um rapaz tão jovem, o que dirá o povo!». Ana,
diplomática, convencera-a que a sua virtude estava acima de qualquer suspeita e
a senhora dona Anastácia aceita alvoraçada.” (p. 171)
“Partiram em
lua-de-mel para a quinta do noivo, que estava preocupado com umas vacas mal
paridas. Não durou a estada mais de uma semana; Laura, na sua linguagem
provocadora, descrevera à irmã, curiosa, dos pormenores nupciais, «não me
importo que ele faça de boi e eu de vaca, até nem me importava de estar sempre
nisso, agora passar o tempo a ouvir falar de tetas infetadas e de vitelos
desmedrados, Deus me livre!». Nunca mais foi ao Alentejo. E costuma dizer,
perante o ar escandalizado da irmã, quando o marido voltava das propriedades,
«la vem o boi à vaca, vai ser um regalo!». E o alentejano ria, ria.” (p. 206)
Por outro lado, traz-nos também uma viagem às
vivências da vida privada dos burgueses, ou da baixa nobreza, durante o período
da monarquia constitucional. Por fim, podemos afirmar que estamos perante uma
obra que, mais que a história de uma família, consegue ser, em parte, também um
romance histórico.
tenho os outros, como sabes.
ResponderEliminar(gosto do blogue, devias ter divulgado. :) )